sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Crítica: Paulo Markun reúne o melhor da produção sobre a ditadura



No ano em que se completa meio século do golpe militar de 64, o jornalista Paulo Markun publica a mais abrangente história da ditadura em que o Brasil esteve mergulhado nas duas décadas seguintes.
Editado em dois volumes, "Brado Retumbante" é o desdobramento de um projeto lançado em site homônimo há três anos, que reúne memórias de personagens que viveram o período.
Os depoimentos, apesar de não contribuírem para uma nova perspectiva do regime de exceção, emprestam frescor à narrativa.

Isaias Feitosa/CPDOC JB/Divulgação
Comício das Diretas Já, com 70 mil na praça da Sé, em 1984
Comício das Diretas Já, com 70 mil na praça da Sé, em 1984
A maior qualidade da obra é a reunião criteriosa da melhor produção sobre a ditadura nos últimos anos, de reportagens a teses acadêmicas e biografias. São textos de mais fôlego, mas com um recorte mais específico.
Para um trabalho que vale sobretudo pela grande síntese, no entanto, "Brado Retumbante" peca às vezes pelo detalhismo.
A luta armada e a campanha a favor das eleições diretas, para citar dois exemplos, são temas tratados com minúcias que parecem excedentes num livro que pretende captar o todo. Pinceladas mais largas talvez propiciassem maior percepção do conjunto.
A opção de privilegiar o factual em detrimento da análise também não ajuda na visualização do painel oferecido ao leitor. Embora a própria justaposição de fatos indique determinada visão dos acontecimentos, ela não chega a substituir a interpretação, que ficou confinada num pequeno capítulo.
Nada disso, porém, diminui o interesse do relato. Ex-apresentador do "Roda Viva", da TV Cultura, autor de vários livros sobre história do Brasil e militante comunista durante a ditadura, Markun soube contar uma história que ele estudou e viveu.
VLADO
O jornalista aborda discretamente sua participação no combate ao regime militar, que o levou a ser preso em 1975, na mesma ocasião em que Vladimir Herzog, seu amigo e correligionário, foi morto pelas forças da repressão, assunto sobre o qual ele se debruçara em "Meu Querido Vlado".
O fato de Markun conhecer por dentro o Partido Comunista é responsável por boas passagens de "Brado Retumbante". No primeiro volume, ele explica como o Partidão, considerado reformista, perdeu influência sobre jovens de esquerda que preferiram o radicalismo da luta armada.

O Brado Retumbante
Paulo Markun
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No segundo, o autor mostra como a atitude conciliadora dos comunistas, que os levou a apostar que a ditadura acabaria com uma solução negociada, afastou o partido da campanha das Diretas.
Num dos depoimentos mais reveladores, Alberto Goldman (na época deputado federal pelo PMDB e militante do PCB) nega a importância da campanha, com o argumento de que a realização de eleições diretas era inexorável.
"Brado Retumbante" é uma boa porta de entrada para quem quiser conhecer melhor a história da ditadura militar.
BRADO RETUMBANTE
AUTOR Paulo Markun
EDITORA Benvirá
QUANTO Volume 1: R$ 37,90 (424 págs.). Volume 2: R$ 37,90 (480 págs.)
AVALIAÇÃO bom